Quis escrever sobre feminismo,
esse ano que passou.
Não consegui.
Minhas ideias talvez atinjam
a obviedade ululante.
Engatinho frente às mulheres
que admiro nesse aspecto.
Não me sinto dona
dos saberes inexoráveis.
Aceito a minha pequenez.
Quis argumentar
que não era racista,
ano esse que passou.
Aos prantos,
a recolher
doces epifanias de infância,
nas quais
os pretos,
os japoneses,
os filhos do porteiro
e todas as crianças do mundo,
tinham meu afeto em igualdade.
Não consegui.
Minhas memórias não bastaram
para explicar os horrores
pelos quais meus queridos
haviam passado.
Uma vez mais,
fracassei.
Quis buscar a quietude,
do outro lado do oceano.
Farta das noites viradas,
dos planetas sem vozes,
de sentir-me ínfima
e ingrata,
ao rejeitar a saúde que tenho,
apesar dos pesares.
Frustei-me.
Eu me carrego
aonde quer que me vá.
E as dores
são imunes às marés.
Quis também amar,
ano que passou.
Encontrei almas
de outras encarnações,
Encolhi-me diante
de instantes plenos.
Assustei-me com a humanidade
das pessoas à minha volta.
Mas não pude colocar
meu coração em dizeres.
Falhei.
Os astros me disseram
que meus portos silenciosos
vêm para a era de Júpiter.
Tentei emagrecer,
parar de fumar,
não ter amnésias,
voar em sonhos lúcidos,
ignorar as insônias,
comer cinco frutas por dia,
não beber mais
do que três taças de vinho,
ser menos agressiva
quando me supusesse inferior,
meditar,
rezar,
estocar comida,
dinheiro,
pulmões
para o dia a seguir.
Indesculpavelmente,
posso afirmar:
a Poesia
permanece,
pois,
esse ano que passou,
sendo
a
única
aliada
a atravessar
o meu futuro.
E eu a desejo,
em proporções
ESTRATOSFÉRICAS,
a todos os meus.